Gaúcha, filha de oficial do Exército, Cecy Cony teve a graça
de sentir, desde os 5 anos, a presença do seu
Anjo da Guarda a seu lado.
Nascida em Jaguarão em 1900, foi freira franciscana (Irmã Maria Antônia) e professora em São Leopoldo, onde faleceu em 1939.
A pedido da sua superiora, deixou interessantes memórias (“Devo narrar minha vida” – Ed. Vozes – 1949). Veja mais este capítulo:
AO RECEBER o soldo mensal, papai tinha o costume de dar 5$000 a cada um de nós para comprar o que desejássemos. Eu já estava com a ‘fortuna’ de 10$000, o que daria para adquirir um bonito par de patins, ao preço de 7$000, e o troco em chocolates.
Sem perda de tempo, saio para as compras. A meio caminho topo com uma pobre negrinha, mais ou menos da minha idade, suja e maltrapilha, a chorar ante os cacos de uma garrafa de querosene que alagava o chão. Parei estática ante aquela triste cena, a olhar, ora para os cacos, ora para a negrinha que se desfazia em soluços. E foi ela quem quebrou o silêncio:
─ Fui comprá uma garrafa de “gáis” pra vizinha e ela ia me dar um tustão, e agora nem tenho dinheiro pra pagá o “gáis”, nem vou ganhá tustão e a minha mãe vai me surrá.
Fiquei com enorme pena da menina, e lembrei-me que dispunha do troco de 3$000 para os chocolates. Disse a ela que iria na farmácia trocar uma nota, e dar-lhe o dinheiro do querosene, mas que parasse de chorar.
A menina, incontinenti, enxugou as lágrimas na orla do vestido e, num dois por três, estava a mostrar os dentinhos brancos como a neve.
Voltando com o dinheiro trocado, fui dar-lhe o valor da garrafa mais um dinheirinho para ela, totalizando 1$500. Mas o Anjo da Guarda me interrompeu. Entendi, então, que meu protetor queria que eu desse tudo: os 10$000. Depois de um tempinho de indecisão, concordei, renunciando, assim, aos patins e às barras de chocolate. Vitória sobre o meu egoísmo!
E mais: combinei com ela que todo dia 4 fosse à minha casa pegar o “precioso soldo” de 5$000, o que ela fez até dezembro de 1914. Em janeiro ela se despediu de mim porque iria mudar-se com uma família para Pelotas (cf obra citada, p. 139-143). *